PALLADIO

quinta-feira, abril 05, 2007

Dr Lúcio

Há algum tempo, li no Vitruvius um artigo da arquiteta Cecília Rodrigues sobre o Estádio do Pacaembú, no qual adorei a frase que ela citou do Dr. Lucio, a resposta do mestre a um parecer solicitado sobre um terminal de ônibus a ser instalado no Passeio Público da cidade do Rio de Janeiro(não pode, naturalmente.) e aproveito para narrar um fato que presenciei há uns trinta e sete anos atrás, que demonstra a seriedade e a solidez de caráter com que ele tratava os assuntos ligados ao patrimônio histórico da nação. Nesta época eu era estagiário de um escritório de arquitetura cujo titular (permitam-me não citar seu nome) trabalhara muitos anos, como estágiário e depois como arquiteto, com o Dr. Lucio. Depois de algum tempo, o mestre conseguiu (seu prestígio internacional era imenso) que seu pupilo fosse trabalhar na França, no escritório do Bernhard Zerfhuss, onde ele ficou por alguns anos acompanhando a obra da sede da UNESCO, em Paris. Voltando ao Brasil, abriu seu próprio escritório mas continuou muito amigo do Dr. Lucio (era esta a única maneira dele se referir ao mestre, em público ou em particular). Pois bem, o escritório foi então convidado para participar de um concurso privado para a sede de um Banco, em um terreno que fazia esquina com a praça Pio X e a Rua da Quitanda, dando também para a rua da Alfândega; o prédio faria frente, portanto, para a igreja de Nossa Senhora da Candelária e o gabarito para a praça era, senão me engano, de dez pavimentos mais térreo, mezzanino e cobertura. Meu chefe, então, "bolou" um partido em que o edifício seria segmentado em três volumes contínuos e justapostos, valendo-se dos diferentes gabaritos da Pio X, da Rua da Quitanda e da rua da Alfândega (os dos dois últimos eram maiores do que o da praça). Satisfeito com sua solução, que achava que era a "sacada" para ganhar o concurso ( e era realmente uma solução engenhosa), levou-a, por precaução, para a apreciação do Dr. Lucio, pois a Candelária era e é, naturalmente, um edifício tombado. Lembro-me que quando ele voltou da entrevista, acorremos todos para saber o que dissera o mestre. "Não pode ser, H., o gabarito tem de ser o da praça Pio X" fora o único comentario do Lucio Costa ao projeto e, podem acreditar, nem passou pela cabeça do meu chefe argumentar ou discutir o partido, apenas disse-nos, "o Dr, Lucio não deixou, vamos fazer com um único gabarito" e nada mais lhe foi perguntado (por nós, estagiários). Assim era o Dr. Lucio.

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