PALLADIO

domingo, outubro 19, 2008

SÃO PAULO, CIDADE GLOBAL

É excelente o livro de Mariana Fix - São Paulo Cidade Global; fundamentos financeiros de uma miragem - publicado pela Boitempo Editorial. A narrativa das modificações ocorridas na construção do espaço urbano da cidade devido à globalização dos mercados, é clara e absolutamente convincente. Acho que sua leitura é importante para compreendermos melhor como se processa o uso (irracional) do solo urbano na atual fase do capitalismo, e transcrevo, a seguir, os últimos parágrafos do livro (originalmente, uma premiada dissertação de mestrado).

[... Resumidamente, o esforço das cidades da semiperiferia do capitalismo em se tornarem globais tem diferenças significativas em relação ao esforço nacional de acumulação do desenvolvimentismo. A falência do desenvolvimentismo, o qual havia revolvido a sociedade de alto a baixo, abre um período específico, essencialmente moderno, cuja dinâmica é a desagregação. Uma das diferenças é a distância que nos separa do núcleo orgânico do capitalismo, que aumenta com a passagem da segunda para a terceira revolução industrial, segundo Francisco de Oliveira. Não há sinal da convergência sugerida pela apologética globalizante e reforçada pela versão normativa da tese da cidade global, embora com uma diferença. No discurso das cidades globais a convergência ocorreria não entre nações, mas entre cidades, por meio da produção de uma série de vantagens comparativas.

No lugar da convergência, além do aumento da distância entre centro e periferia, na divisão internacional do trabalho, aprofunda-se, internamente, o fosso entre dominantes e dominados. Essa nova diferença quantitativa obriga os dominados a um esforço descomunal para superá-la, o que introduz uma nova qualidade na desigualdade: a quase completa ausência de horizonte de superação.

Assim, essa operação de substituição de mitos é bastante limitada. Se o mito do desenvolvimento não mais convence, no sentido de uma recuperação restauradora que permita aos povos pobres desfrutar algum dia das formas de vida dos atuais povos ricos, ainda assim mobilizou os povos da periferia e os levou a aceitar enormes sacrifícios, na explicação de Celso Furtado. O mito das cidades globais, por sua vez, já nasce enfraquecido, e por isso ganha ares de farsa. Tem como miragem as novas centralidades produzidas em cidades como São Paulo, que reproduzem, em escala modesta, o "skyline" que mimetiza os centros de comando e projeta, em um país semiperiférico, a imagem de uma "global city". Cria-se uma nova paisagem de poder e dinheiro que mobiliza Estado e capital privado nacional, parceiros nas várias modalidades de apropriação do fundo público, que caminham no sentido de transformar a cidade, ela própria, em uma espécie de título financeiro.